Entre as várias figuras típicas e episódios pitorescos de que nos lembramos, não resistimos à tentação de deixar para vós alguns deles. Poderão parecer coisas simples demais para figurarem aqui, mas, se reflectirdes bem, concluireis que não é só de coisas sérias e muito formais que a vida se faz, mas também de alegria e bom humor, tão necessários nos apreensivos tempos de hoje.
Então, aqui vai:
Duas pessoas muito divertidas, o Abílio “Rato” e o “Mano”, invariavelmente todos os domingos, à tarde, davam a volta por algumas ruas da freguesia, tocando bombo, rufando caixa e animando o povo para que esquecesse as agruras da dura vida de então.
Quem verdadeiramente exultava de alegria era a garotada que rindo e saltando, de pé descalço, pois nesse tempo calçado era luxo só para alguns, não largava a dupla de tocadores enquanto se fizessem ouvir.
Outra figura de Barrô, ainda hoje citada, foi o Manelzinho, lavrador abastado, franco e muito engraçado. Rara era a pessoa sua conhecida, quer da terra ou de fora, que ao passar à sua porta não lhe oferecesse um copo de vinho na sua adega.
Certa vez um seu amigo, do vizinho lugar de Paradela, regressava do Vale do Grou com uma carrada de mato, num dia de grande calor. O Manelzinho, que habitualmente estava à janela, ao avistá-lo, convidou-o para ir à adega tomar um copito, o que ele aceitou de imediato já que estava cheio de calor, de sede e certamente com algum apetite.
Já na adega, o Manelzinho encheu o copo e deu-o ao amigo.
Como este não bebesse, perguntou-lhe porquê, ao que ele respondeu:
– “Estou habituado a pôr qualquer coisa na boca para beber”.
O Manelzinho de imediato chama a criada:
– “Ó Rosalina, traz cá o freio da égua para por na boca deste homem”.
O episódio ainda hoje é, por graça, contado na freguesia, apesar de, há muito, os dois terem deixado o número dos vivos.
Depois destes episódios pitorescos, vamos lembrar mais duas figuras, estas sim verdadeiramente típicas, daquelas que existem em toda a parte e que marcam as suas terras pela maneira jocosa e hilariante como vivem e agem.
Uma era o Mário de Barrô, o “Trórem”. Que ele até nem era natural desta freguesia, mas era daqui que dizia ser, e era assim que o conheciam por toda a região, que percorria a pé, principalmente para ir às festas e romarias, algumas a muitos quilómetros de distância.
O seu andamento era tão rápido, que nem os mais conceituados atletas da marcha fariam melhor.
Contou-nos um amigo músico, que há muitos anos, (talvez mais de 50), quando o Mário estava em plena forma física, a Banda de Travassô, que esse nosso amigo integrava, tinha um serviço em Vila Nova de Monsarros – Anadia, onde teriam de estar às 9 horas da manhã. Cedo ainda, ao passar com outros colegas, de bicicleta, pelo Carqueijo, encontraram o Mário em passo acelerado, como sempre.
Qual não foi o seu espanto quando, após a chegada ao local das festas e depois de beberem um copito para irem iniciar a arruada, vêm chegar o Mário, ofegante, mas no mesmo passo de gigante. Disse esse amigo, que o tempo de atraso em relação a eles, não terá sido superior a 20/30 minutos.
Com o entoar do seu característico “Trórem”, chamava a atenção das pessoas das terras por onde passava, que diziam: – “lá vai o Mário de Barrô”.
Outra figura típica era o Saúl Marques (conhecido por Saúl da Pessêga), pela sua vocação de polícia sinaleiro.
Quantos automobilistas, motociclistas, ciclistas e até peões ele não “ajudou” a desenvencilhar do trânsito, no cruzamento do Santo António?... E ai de quem não obedecesse à sua sinalética! Ouvia logo a adequada repreensão. Claro que um copito ajudava a desempenhar melhor a sua missão…
Estas típicas figuras de Barrô ( e mais haveria a mencionar) e de todas as outras terras onde existiam, e ainda existem – quem não se lembra dos Chetas, do Julinho, do Bibi, do Magina e outros mais, verdadeiros “ex-libris” de Águeda – contribuiam muito para que as pessoas fossem mais alegres, mais despreocupadas e esquecessem as agruras desta vida, por vezes tão difícil.
Sem elas, a sociedade seria mais tristonha e sorumbática.
In «Barrô ao longo dos tempos»
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