Não tenho tempo para dar tempo ao tempo.
Quando eu era pequena
passava tardes e tardes metida
dentro duma arca onde o meu avô, que era alfaiate,
guardava as fazendas. Era uma caixa quentinha
e eu gostava de estar lá
porque o meu avô contava-me muitas histórias
porque era uma sala onde havia muito sol
porque o chão era de tábuas
porque o relógio da parede tinha um som alegre
porque eu tinha almofadas à minha volta
e não tinha medo de cair nem de me magoar
porque o meu primo brincava muitas vezes comigo
e ficávamos os dois ali, quietos e sossegadinhos
à espera da merenda que era um pão com marmelada.
E era tudo tão bom, tão doce, tão lindo,
porque não havia mais nada
e o meu coração cabia inteirinho
dentro daquela arca de madeira.
Hoje
não sei onde meter os meus pensamentos
e a minha solidão não cabe em lugar nenhum.
15-12-1994
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4 comentários:
Nossa! temos uma poetisa por aqui! Muito lindo.
Nada de solidão..quando quiser conversar estamos aqui!
Ó Mofina M. cibernauta, estás(mos) a ficar velha(os). Que saudades desse tempo e dessa sala, do avô e de tantas coisas boas!...Agora damos valor a coisas que nada valiam!!
Victor, o primo eras tu?
Mofina, gosto muito da tua poesia. Em tempos também escrevi alguns esboços mas perdio-os todos e agora tenho tanta pena, porque com eles foram registos de momentos como este teu. Momentos que nos transportam a esse mundo que foi nosso, que coube na nossa mão e que em nada se parece com o de hoje. Em casa dos meus avós também havia uma caixa de madeira, o soalho de tábuas rangendo sob os nossos pés levezinhos, um lagar onde brincava à escondidas, um poço onde vivia a "Maria das Grades"...enfim, são tantas as memórias e as dores de um tempo passado mas tão grande e tão grandioso.
Que tal num blog?!
;)
(Estava tão quieto o outro lado que vim à tua procura!)
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